quinta-feira, 29 de abril de 2010

Lamúrias de um guerreiro


Se algum historiador tivesse acesso a um diário de algum guerreiro medieval, o que vocês acham que encontraríamos escrito? Certamente os relatos de suas batalhas, conquistas, dissabores e glórias intermináveis. Porém, podemos aqui pincelar algumas de suas melancolias.

“Estou cansado. Farto de batalhas diárias, de decepções constantes e de brigas sem fim. Cansei-me de perder amigos de outrora. Não vejo mais a luz do céu, ou a beleza de uma flor ao desabrochar precocemente numa manhã de domingo.
Faltam-me forças para empunhar minha espada. Minha couraça já não é mais tão sólida. Meus dentes cerrados, escondem meu sorriso, que há tempos não o apresento. Meu olhar vermelho não enxerga beleza nas coisas. Só vê maldade e escuridão.
Nos homens, não confio. Meus ombros caídos por levar pesadas armas não dispõem da mesma disposição. Minhas costas, repletas de apunhaladas vis, não têm mais espaço nem para uma derradeira apunhalada de falsos companheiros.
Olho aos céus, peço a proteção e a clemência divina, porém como um castigo celestial, minha batalha não termina. Meu campo de batalha é perene, e os inimigos não cessam. Pedras e lanças se revezam em meu peito. Meu escudo, já com o peso de 300 homens, não consigo carregá-lo.

Creio que estou morto, só não acordei para tal realidade nefasta. Meu rei foi deposto. Meu comandante perdeu o controle de meus companheiros de luta, e quando vejo meus guerreiros na frente de batalha, deparo-me só com um punhado de bravos gentios. Alguns que chego a contar nos dedos ainda que me restam. Aponto e admiro como decepam a cabeça do inimigo. Nem a força colossal daqueles que ainda estão de pé, me motiva.

Movo-me ainda para conduzir meu corpo falido a um campo verdejante, onde posso encostar minha carcaça. Em mim, nem a esperança tem espaço. Meu coração pedrou. Minha alma não é mais minha. É daqueles que eu matei e deixei no meio do caminho. Minha batalha não tem mais bandeira.

Meus sonhos secaram. Não existem. Meu amor, se foi. Morreu. Assim como meus filhos e netos, que jamais tive, nem terei. Acamparam em mim não mais saudades, e sim trevas.

Sou um guerreio cansado, sem amanhã, sem ontem. Apenas o agora me importa. Entego-me”.
Deve ser mais ou menos isso.

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