segunda-feira, 13 de setembro de 2010

O dia em que eles usaram capas


Era uma sexta-feira, 13. Tarde ensolarada de um pré-verão de setembro na capital alagoana. O ano era 1957, e o governador de Alagoas era Sebastião Muniz Falcão. Populista, Muniz Falcão inventou de taxar os usineiros com um imposto que levantava fundos para financiar a construção de escolas e postos de saúde. Não sabia ele, que aquela tarde mudaria para sempre o futuro do estado. A bala ia comer....acompanhem.

Bem, desde sempre Alagoas teve um passado voltado para a violência. Desde quando o o Frei Diego Sardinha foi literalmente 'comido'em nossa costa, até a luta de Zumbi contra os portugueses, assim como Calabar, Ana Lins, entre outros. A história do alagoano é de bravura e de muito, muito pavio curto. É na bala ou na faca. Lamentável, mas é verdade.

Segundo alguns historiadores, isso acontece pois herdeiros da saga da Canudos se refugiaram em Alagoas e ajudaram a cultivar no povo Caeté um ímpeto de não levar desaforo pra casa. E é por isso e muito mais, que a morte do Beato Francisco, em Palmeira dos Índios, em 1956, e o assassinato do deputado estadual Marques da Silva, em Arapiraca, provocou em Alagoas um ar carregado de violência e deixou o cheiro de sangue nas ruas e vielas da capital.

Vinte e dois deputados oposicionistas, culpavam Muniz Falcão pela violência que assolava Alagoas, desde lá, e proporam então seu impeachment (o primeiro de um chefe de Estado da Federação). Enfim...O cadáver de Marques da Silva nem tinha esfriado, e as promessas e ameaças corriam pelo Estado.

O governo federal foi avisado. O clima era insuportável. As barricadas eram levantadas dentro e fora do prédio da Assembleia. Sacos de areia protegiam a Mesa Diretora. A tensão era uma só. Após a entrada do último deputado, o funcionário selou a porta para ninguém entrar ou sair. O senador Juracy Magalhães, assim com o deputado Freitas Cavalcanti tentaram evitar a tragédia conversando com o presidente da Casa, deputado Lamenha Filho. Em vão, o derramamento de sangue foi inevitável.

O deputado estadual Humberto Mendes, sogro de Muniz, e valente líder da temida família dos Mendes, de Palmeira dos Índios, era o líder dos situacionistas. Assim como ele, os outros 34 deputados entraram na Assembleia Legislativa vestindo carregados casacos de frio num sol escaldante. Os volumes nas capas eram na verdade as metralhadoras, pistolas e revólveres sedentos por sangue.

O primeiro tiro, segundo Jorge Oliveira, em seu livro Curral da Morte, foi dado pelo deputado Humberto Mendes, porém foram os tiros de Virgílio Barbosa, disse o jornalista Rubens Jambo, que cobria o evento, vitimou Mendes, atingido no abdômen. Em doze minutos foram disparados pelo menos 1.200 tiros.

Era bala zunindo de dentro pra fora do prédio, assim como de fora pra dentro. A Praça Dom Pedro estava tomada pelo Exército. Os tanques que lotaram a capitala alagoana um dia antes, nada puderam fazer. Soldados ocupavam os prédios estratégicos ao redor da Assembleia. As sacadas da Catedral e da Fazenda Fiscal eram pontos de tiro para os soldados. Os alvos? O interior da Assembleia.

Os 35 deputados alagoanos estiveram envolvidos no tiroteio. Um morto - Mendes - e outros mais feridos, como o jornalista Márcio Moreira Alves - baleado na perna e ganhador do Prêmio Esso pela matéria. O Hospital de Pronto Socorro ficou tomado pela polícia, pois a ameaça de novos tiroteios era presente. Os 22 oposicionistas foram encaminhados para o Quartel do Exército.

Tal fato foi notícia até fora do país, Estados Unidos, Europa e o mundo a fora conheceu a violência alagoana. Muniz foi afastado, porém voltou nos braços do povo em janeiro de 1958.

De fato, foi o dia em que Maceió parou. No dia 14 a cidade parecia fantasma. Bares, cinemas, restaurantes, comércio, lojas, tudo parou. Taxis, ônibus, carros, nada andou. Era um marasmo onde o medo reinava.

Será que hoje é diferente? Não importa o governante que esteja no Palácio do Governo. A Assembleia é que conduz os caminhos e destinos. Assim como naquela época, hoje muitos pensam que são senhores de nosso destino. Daquele tempo, não há mais deputados sobreviventes, mas parece que seus fantasmas continuam no prédio assustando os atuais titulares. Seja influenciando ou inspirando.

Deus nos abençoe. Que não esqueçamos aquele 13 de setembro de 1957.

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