sábado, 6 de junho de 2009

A solidariedade do povo do sertão


Fui fazer a cobertura jornalística de entrega de cisternas no mês de março, se não me falhe a memória. Santana do Ipanema, povoado do Óleo, só de barro era uns 18 km saindo de sede do município. Depois de muita poeira, solavancos, sol e muito calor, como lhe é peculiar o Sertão alagoano, chegamos a localidade.

Lá me deparo com a realidade do pobre sertanejo que vive unicamente da escassez e a limitude de recursos básicos para a sobrevivência humana. Uma das beneficiadas do programa do governo federal, com parceria do Estado, dona Genira Carvalho, recebeu nossa equipe de braços, e pelo visto de coração aberto também.

A sofrida sertaneja fora abandonada pelo marido alcoolatra. Sozinha ela cuida de sete filhos, mais dois cunhados à tira colo, como se não bastasse. A guerreira Genira andava um bom pedaço de chão para conseguir um mísero balde de água. Bem, para quem conhece o Sertão sabe que qualquer andar de légua já serve como purgatório aqui na terra.

O calor escaldante, a fome, a distância, o peso do balde. Tudo isso só aumentava o sofrimento dessa pobre senhora de coração bom. Zelosa por sua moradia, d. Genira sempre deixou a casa bem arrumada, e não deixou os seus desamparados. "O estudo é tudo, por isso quero que meus filhos estudem para que eles não passem o que eu passei, e ainda passo", lições de uma mestra.

Após mostrar sua pequenina propriedade onde planta feijão, macaxeira e demais, nossa equipe foi embora. Com fome, eu, meu repórter fotográfico, Tércio Cappello, e o motorista Franklin, fomos comprar bolachas na simples vendinha da localidade.

Quando estávamos a traçar os secos biscoitos, um pivete veio me puxar pela calça. "Moço, a senhora ali tá chamando de novo", disse o pimpolho raquítico. Bem, pensei eu que dona Genira tinha esquecido algo para acrescentar na matéria. Fomos então....Quando passamos a porta da senhora nos deparamos com um digno banquete dos Deuses.

Dona Genira nos apresentou uma refeição farta e de encher os olhos: galinha cabidela, manteiga de garrafa, feijão da horta, arroz, farinha do Sertão, huuuuuuuuuuuummmmmmm. Descrever o sabor daquela galinha seria injusto com o paladar. Não seria tão fiel. Era tudo feito com tamanho carinho que fiquei sem ação.

A lágrima rolou. Olhei para Tércio e Franklin, ambos estavam tão embasbacados quanto eu. Eu me emocionei e disse que não era preciso a imensurável demonstração de aprazividade. Fiquei chocado. Uma pessoa com tantas dificuldades, gente simples, dona Genira dá muito duro para criar sua ninhada e mais dois encostos, e mesmo assim tem forças para receber três estranhos em casa e ofertar-lhes o melhor que tem.

Não vejo esse tipo de coisa em lugar nenhum do mundo. É muito desapego e humanismo. É dar realmente sem olhar quem seja. Solidariedade com o próximo, mesmo sem imaginar que o verá novamente. Para nós foi a maior apresentação de humanidade que já tínhamos testemunado. Chorei pelo coração imenso que d. Genira nos apresentou.

Em tempos de correria, frieza, indiferença, individualismo e desumanidade, ela mostrou que longe das grandes cidades existe solidariedade, existe paixão pelo outro. Por onde passo conto essa história e orgulho-me a cada dia de ser nordestino e alagoano. Dona Genira é apenas um exemplo do que temos por aí. Uma pessoa com amor, receptividade e carinho pra dar e vender.

Saímos saciados por sua comida deliciosa e original, mas também saímos com uma lição de solidariedade, e muita gratidão no coração. Pois realmente estávamos com bastante fome. Nosso motorista Franklin repetiu umas três vezes, suando como se fosse morrer. Mas é justificável devido as nossas necessidades no momento. Muita fome...rsrsrsrs. Ah, se eu comi muito, bem...sem comentários, comi sim e bem demais. Tércio não passou em branco e também aprovou o tempero de nossa anfitriã.

Lições demais para um dia apenas. Voltamos na estrada com o coração apertado, pois não sabíamos se ela teria aquela refeição no dia seguinte. Pedi a Deus que a protegesse ainda mais, pois apenas Ele para acolher esse povo tão sofrido do Sertão, mas que mesmo assim resiste e é forte.
Força que sentimos de perto. É a força singela do ser humano, que mesmo penando, ri para a necessidade e se entrega para Deus com a esperança que tudo vai dar certo. E vai dar sim, pois Deus não abandona os bons de coração. E dona Genira demonstrou que tem uma alma de santa, que se doa e não pede nada em troca. Bondade não é para todos..Deus continue abençoando. Amém.

2 comentários:

  1. Que linda, D. Genira!! E que ser humano lindo é tb vc, amigo! Em reconhecer a bondade alheia. Pois só a reconhece msm, os justos e os bons.

    Bjo!

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  2. Du, chorei, um texto como esse não pode passar desapercebido...concordo com a colega. É só te conhecer pra saber a pessoa linda q mora aí dentro. É tão bom quando escrevemos com o coração puro.

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